Bento 16 cancela visita a Universidade após protestos
Guilherme Aquino
De Milão para a BBC Brasil
Papa Bento 16 no Vaticano, Roma
Para Bento 16, futebol pode ensinar lições de vida aos jovens
O papa Bento 16 cancelou uma visita que faria na quinta-feira à prestigiosa Universidade La Sapienza, em Roma, depois que estudantes e acadêmicos protestaram contra sua posição em relação à condenação de Galileu Galilei.
De nada adiantaram a garantia de segurança e a quebra de protocolo - um passeio de carro pelo campus ao invés de ir a pé - por parte das autoridades do governo e do reitor Renato Guarini.
O cancelamento foi anunciado pelo Vaticano no final da tarde desta terça-feira. "O Vaticano achou oportuno desistir da visita depois dos conhecidos eventos dos dias passados", afirmou a nota da Santa Sé.
Universidade La Sapienza
Slogans contra o papa começaram a aparecer na universidade
O Sumo Pontífice tinha sido convidado para a inauguração do Ano Acadêmico, uma importante e tradicional cerimônia, e daria uma aula magistral.
Mas uma escalada de protestos culminou, na manhã desta terça-feira, com a ocupação da sede da reitoria por um grupo de manifestantes contrários à visita papal.
Ciência X Religião
Logo depois da confirmação da vinda do Papa Bento 16, dezenas de estudantes penduraram cartazes na entrada dos prédios do campus, principalmente na fachada das faculdades de Física, Ciências Políticas e Filosofia.
"O Papa é contra a universidade", "A ciência é leiga", eram algumas das mensagens destinadas ao bispo de Roma. A manifestação ganhou corpo depois que 67 professores fizeram um abaixo-assinado pedindo o cancelamento da visita.
Eles não concordam com o que consideram uma ingerência da Igreja católica no Parlamento italiano - a lei do aborto pode ser revista por causa das pressões eclesiásticas - e nem com a posição da Igreja sobre a ciência, não apenas de hoje, mas desde os tempos de Galileu Galilei. O papa prega que a fé deve se sobrepor à ciência, e os pesquisadores e cientistas leigos não concordam com esta linha de pensamento.
Para a véspera da visita estava programado um "ensaio geral" dos protestos na Faculdade de Física. "Como físico não gostei da declarações feitas por este papa sobre a ciência, achei um endurecimento em relação ao do seu antecessor João Paulo 2º", disse ao jornal La Repubblica, o professor Giorgio Parisi, um dos assinantes da carta.
Galileu Galilei
Os físicos tomam ainda partido de Galileu Galilei contra o Papa Bento 16. Eles lembram que o então cardeal Joseph Ratzinger, em 1990, durante um discurso, teria justificado o processo da Igreja contra o astrônomo que comprovou a tese de Copérnico de que a Terra girava ao redor do Sol e não o contrário.
Para não arder na fogueira da Inquisição Galileu aceitou as imposições do clero e acabou sendo condenado à prisão domiciliar.
Um filme sobre Galileu - acusado de heresia pela Igreja em 1632-33, durante a Contra Reforma - foi exibido nas dependências da universidade.
Os meios de comunicação foram usados para alimentar a polêmica no começo da semana com uma guerra nos meios de comunicação. De um lado, a Radio Vaticano expressou preocupação com "iniciativas com tons de censura". Ao microfone, o reitor Renato Guarini lembrou que a La Sapienza tem 4,7 mil professores e a grande maioria é favorável à visita do papa.
De outro, a Radio Radical, da coalizão do governo de centro-esquerda - deu voz à ministra de Comércio Exterior e Políticas Européias, Emma Bonino, que afirmou ser "preocupante que o papa seja o único a ter a palavra de manhã à noite, juntamente com os seus seguidores e a moral católica".
Condenação unânime
A decisão do papa Bento 16 de não ir mais a La Sapienza conseguiu o milagre de unir o centro do governo e a oposição italianos. Ambas as forças políticas, através de sua lideranças, condenaram os ataques ao Sumo Pontífice.
"Condeno quem provocou tensões", disse o primeiro-ministro Romano Prodi, pedindo que Bento 16 reveja a decisão de não aceitar o convite. "É inadmissível que o papa não possa falar numa universidade que é a sede do diálogo e da abertura", disse ele durante o principal telejornal da noite, TG-1, da emissora estatal RAI.
"É uma ferida que humilha a universidade e a Itália", declarou o líder da oposição, Silvio Berlusconi.
"Recebo a decisão da Santa Sé, respeito-a, mas estou amargurado", afirmou em nota oficial o reitor da La Sapienza, Renato Guarini, autor do convite ao papa.