Prémio Nobel da Medicina para Células Estaminais (Genética)
Manipulação genética de células estaminais embrionárias vence prémio.
Ganharam, literalmente, por knockout (KO). Os três laureados, ontem, com o Nobel da Medicina - os americanos Mario Capecchi e Oliver Smithies e o britânico Martins Evans - distinguiram-se pelas suas descobertas na área da terapia genética, uns neutralizando genes partilhados por ratos e homens (a técnica do knockout, seguida da "recombinação homóloga"), outro isolando células estaminais embrionárias.
Trabalhando separadamente, o trio trouxe nova esperança ao tratamento de doenças degenerativas, como a de Ahlzeimer; crónicas, como o cancro e a diabetes; além de doenças cardiovasculares. "Benefícios para a Humanidade", enfim, "que vão continuar a aumentar nos próximos anos", como garantiu, em comunicado, o Comité Nobel do Instituto Karolinska, de Estocolmo.
Os dois cientistas americanos (o octogenário Smithies e o septuagenário Capecchi) lograram modificar o código genético de ratinhos (ora "ligando", ora "desligando" genes), enquanto o investigador britânico, sessentão, trabalhou durante anos no isolamento de células doentes, nomeadamente cancerosas, de animais de laboratório.
Tarefa hercúlea: mais de dez mil genes de ratinhos (cerca de metade do genoma dos mamíferos) já foram postos KO, expressão que, no boxe, é usada para designar as derrotas inapeláveis de quem cai no ringue e já não se levanta.
Indirectamente, esta é uma "dupla vitória" para Londres, uma vez que, além de Martin Evans, melhor dizendo Sir Martin Evans, de 66 anos, também Smithies, de 82, nasceu no Reino Unido, acabando por se naturalizar americano após ter emigrado para os EUA. O mesmo se passou com o "italiano" Capecchi, que viu a luz do dia em Verona há sete décadas.
Assim se confirma que a biomedicina "pula e avança", malgré tout, malgré a ferocidade dos seus detractores, sobretudo dos conservadores americanos, com George W. Bush à cabeça.
O Presidente vetou, em 2006, em nome dos embriões excedentários, uma lei do Congresso que permitia a investigação com células estaminais. KO, também, para estas "forças de bloqueio", dado que é o segundo ano consecutivo que o Prémio Nobel distingue a área da genética (em 2006, foram galardoados os americanos Andrew Fire e Craig Mello, este de ascendência portuguesa).
Um olhar português
A importância do trabalho de Capecchi e Smithies foi, explica a investigadora portuguesa do Instituto de Biologia Molecular e Celular, Perpétua do Ó, mostrar que é possível produzir alterações no DNA de forma dirigida e controlada. Partindo do processo natural de recombinação homóloga, estes investigadores demonstraram que esse mecanismo podia também ocorrer em células em cultura, introduzindo mutações ou sequências correctas no DNA.
Martins Evans demonstrou a existência de células estaminais embrionárias e a possibilidade de, introduzindo essas células no embrião de uma ratinha grávida, criar ratinhos quiméricos, ou seja, com propriedades genéticas de progenitores diferentes.
As duas tecnologias são ferramentas, diz, que abriram portas para conhecer a expressividade dos genes e criar modelos animais para doenças humanas.
Rui Reis, da Sociedade Portuguesa de Células Estaminais e Terapia Celular, assinala a importância desta distinção para mostrar que a área das células estaminais não é "apenas um potencial".
Realçando os avanços permitidos na investigação, Daniel Serrão, especialista em Ética, alerta para os problemas de segurança que as terapias genéticas em humanos ainda levantam.
DN (09-10-2007