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 CARTA ABERTA A 'O INIMIGO PUBLICO' QUE FOI MAU COMIGO

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Vitor mango

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MensagemAssunto: CARTA ABERTA A 'O INIMIGO PUBLICO' QUE FOI MAU COMIGO   CARTA ABERTA A 'O INIMIGO PUBLICO' QUE FOI MAU COMIGO EmptyDom maio 04, 2008 3:02 am

CARTA ABERTA A 'O INIMIGO PUBLICO' QUE FOI MAU COMIGO

Ferreira Fernandes
jornalista
ferreira.fernandes@dn.pt
Esta semana, o conceituado semanário O Inimigo Público - que à sexta-feira traz o Público à volta, como o Expresso traz o saco de plástico - dedicou-se à epidemia de saudades sobre o Maio de 68 que varre o País. Num artigo intitulado "Oh não! Já começaram a pregar petas sobre o Maio de 68", meteu-se comigo. Cito: "O Ferreira Fernandes , por exemplo, garante que esteve no 25 de Abril, no Maio de 68, na Guerra dos Seis Dias (Junho de 1967), na Independência dos EUA (Julho de 1776) e na partida do Fernão de Magalhães (Agosto de 1556) tendo assim testemunhado um straight flush (Abril, Maio, Junho, Julho e Agosto) de acontecimentos relevantes."

Descobriram-me a careca. De facto, nem a um par de duques assisti. Cheguei a Paris um ano depois do Maio de 68, e a Lisboa na semana seguinte ao 25 de Abril; o Moshe Dyan, com a pala, viu mais do deserto do Neguev que eu com os meus dois olhos abertos; o mais perto que estive da independência dos EUA foi a tomar chá, em Boston, é certo, mas em Dezembro; e o Fernão, por eu ter chumbado nos testes anti-enjoo, preferiu o Sebastián para imediato, mandando a minha candidatura por "del cano abaixo" (como ele disse, o traidor, em portunhol).

Esses os factos. Mas O Inimigo Público excusava de ser tão cruel comigo. Sugerir que não estive num sítio em data importante é como revolver a faca numa ferida aberta. Na verdade, a minha carreira pode ser resumida assim: "Aquele que não esteve lá." Ou, se esteve, chegou tarde.

Da primeira vez que passei pelo DN, anos 90, o director Bettencourt Resendes mandou-me para a Tailândia onde tinha havido um golpe militar. Ainda eu ia de avião e os generais já se tinham arrependido. Tive de escrever sobre as ossadas dos portugueses na cidade de Ayuthia, assunto emocionante mas um pouco demodé (as campas eram de 1511).

No entanto, o director continuou a apostar em mim: "Quero-te em Los Angeles. Vão ser julgados os tipos que bateram no Rodney King." Este era um negro que fora filmado a ser espancado por polícias. Esperavam-se explosões nos bairros negros durante o julgamento. Comprei um colete de dez bolsos e um seguro reforçado. Fiz uma crónica que deu brado. Brado interno, entenda-se. Escrevi: "Estou em Malibu, bebo um Bloody Mary, sentado no meu Chevrolet descapotável, e aborreço-me." Era a pura verdade. Nem o bairro de Watts, o mais violento, se mexeu durante a minha estada em Los Angeles. A administração do jornal fez-me saber que não estava disposta a pagar para eu andar a laurear a pevide. Mas tenho eu culpa por espantar a pólvora?

Por essa altura, já a ONU me tinha debaixo de olho, para embaixador itinerante. Dizia-me o secretário-geral Boutros-Ghali: "Você vai para os pontos quentes do globo e aquilo arrefece logo." Eu seria uma espécie de fotógrafo Sebastião Salgado mas ao contrário. Onde ele chegava é porque a coisa estava preta. Eu chegava e compunha-a. Não aceitei o convite porque achei incompatível com a carteira profissional. Anulando crises eu tirava o pão da boca dos meus colegas.

Mas continuei na mesma. Com uma equipa da RTP filmei as Torres Gémeas... dias antes do 11 de Setembro. Andei com os guerrilheiros da UNITA seis semanas e nem um tirito para amostra. Na guerra dos Balcãs, andei pela Croácia e Kosovo, nem tudo paraísos mas lugares catitas comparados com a Bósnia, onde nunca estive . Sou um Gandhi da esferográfica. Eu merecia ser um verso do Imagine de John Lennon. E foi isso que O Inimigo Público, cruelmente, me recordou.
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