Fundo antichoque para dias ainda piores
Europa prepara-se para novos choques de desemprego com um fundo inédito
ncarla aguiar DN-Rodrigo Cabrita
Sinal. Reconversão profissional terá novas verbas a partir de 2007
Ao contrário do que aconteceu no passado, o fundo será orientado não para empresas em agonia, mas para apoiar a reconversão de trabalhadores
Será que o verdadeiro choque da globalização, com efeitos no emprego dos europeus, ainda está para vir? A Comissão Europeia parece acreditar que sim e, pela primeira vez, chegou em Outubro a um acordo de princípio para a criação de um fundo para a globalização - para apoiar as vítimas das falências, reestruturações e deslocalizações -, que, se não houver recuos de última hora, deverá ser aprovado em Dezembro, quando se discutirem as perspectivas financeiras da União Europeia para 2007-2011.
"A Europa percebeu que se não reforçar a sua política de reestruturações vai perder o comboio para a China, pois esta já está a apostar nos produtos de elevado valor acrescentado, e seguir-se-ão outros choques muito mais graves", disse ao DN a conselheira especial da Comissão Europeia, Maria João Rodrigues. A China acaba de aprovar o seu plano quinquenal, que, numa viragem política, traça as metas do desenvolvimento sustentável, da sociedade harmoniosa e do conhecimento e inovação, ou seja, concorrendo com os mesmos objectivos da União Europeia.
Como pano de fundo ao ambicioso e singular projecto europeu está não só a intenção de amortecer o impacto da liberalização, a partir de Janeiro deste ano, das importações dos têxteis da China e Índia, mas também a de antecipar as consequências de processos idênticos nos domínios da agricultura. As negociações nesse sentido, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), tiveram início em 2000 e deverão conhecer mais um capítulo este mês, em Hong Kong.
Mal-amado por uma série de Estados membros - pela resistência em assumir mais compromissos financeiros -, o projecto para o fundo "antichoque" foi sobretudo defendido pelo ex-comissário europeu para o Comércio Externo, Pascal Lamy, como contrapartida à abertura das fronteiras aos têxteis chineses. E não sem razão de ser. De acordo com um estudo encomendado por Bruxelas, só a liberalização do comércio têxtil provocará o desaparecimento de mais de 120 mil postos de trabalho por ano nas indústrias europeias do sector. Já a nível mundial, a OMC estima a perda de 30 milhões de postos de trabalho. Para Portugal, o mesmo estudo prevê que a produção do sector caia 2,5% a 5,9% nos 15 anos seguintes à liberalização, sendo que entre 1995 e 2001 o volume de emprego no sector já caiu 22%.
Um acordo pessoal entre Tony Blair e Jacques Chirac terá contribuído para dar uma nova viabilidade ao projecto do fundo para a globalização. E a orientação política, já assumida, é a de que, "ao contrário do que sucedeu no passado, os apoios não devem ser canalizados para empresas em agonia, mas para as pessoas", adianta Maria João Rodrigues, coordenadora da Agenda de Lisboa.
Aquele instrumento deverá ser financiado, ao que tudo indica, pelo Fundo Social Europeu, para apoiar a formação (na óptica de reconversão profissional), o desenvolvimento local e ajudar directamente os trabalhadores vítimas de desemprego. Aquela conselheira alerta para a necessidade de definir estratégias de formação orientadas para os novos empregos que a Europa pode criar no futuro (ver texto em baixo).
No âmbito do próximo quadro comunitário de apoio, os três programas considerados prioritários são o da competitividade e inovação, o da aprendizagem ao longo da vida e o do investigação e de-senvolvimento.