'Borda d'Água': "O verdadeiro almanaque" (e defensor) da natureza
Um breve olhar sobre a banca da fruta do Pingo Doce, em Algés, bastou para fazer saltar o comentário da boca de uma jovem cliente: "Credo! os morangos estão tão caros." Ao que uma "velha freguesa" do mesmo supermercado, uma senhora aparentando uns generosos 60 e tais respondeu: "Oh menina! na semana passada estavam muito mais caros. Sabe... vêm todos das estufas." Assumindo um olhar vago, como quem se prepara para viajar no tempo, soltou a saudade: "lembro-me, no Verão, quando era menina, de ir à horta do meu avô roubá-los! Eram pequeninos e tortos, mas tão doces... Estes, são grandes e vistosos e não sabem a nada. São fora de época, sabe?".
Por isso também mais caros. E foi também isso mesmo que a jovem do Pingo Doce de Algés ficou a saber, numa conversa de minutos.
Mas se tivesse lido no Borda d'Água - "o verdadeiro almanaque da natureza", como ele se intitula, na página 6, referente ao mês de Abril, ficaria a saber que os morangos começam a ser cultivados por esta altura e não em Janeiro, Fevereiro ou Março.
Vejamos o que diz o Borda d'Água: (...) Na horta semear, no crescente, em local definitivo, abóboras, alfaces, batata, beterraba, brócolos, cenoura, couves, fava, melão, melancia, nabo, pimento, rabanete, salsa etc. Em viveiro, semear morangueiros, cebola, pepino e tomate. Na 2.ª parte do mês, semear feijão temporão".
Vendido de mão em mão por imigrantes de Leste, bateu o seu recorde de vendas em 2005 ao alcançar os 320 mil exemplares. Um valor que parece não corresponder ao número de pessoas que demonstra ter aprendido alguma da sabedoria que ele comunica. É pena!
Dirigida por Célia Cadete, a publicação vem de longe. Segundo Manuel Viegas Guerreiro e David Pinto Correia, professores da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, o primeiro escrito em português foi o Almanaque Perdurável (Séc. XIV). Antes do Verdadeiro Almanaque Borda d'Água, existiu O Velho Borda d'Água, pela Livraria Barateira.
Mas o almanaque do "velho da cartola", meteorologista da época que pendurava a folha que traz debaixo do braço na margem do rio, com alfinetes ou molas, também se preocupa com o aquecimento global e as alterações climáticas. Feita uma explicação exaustiva sobre o assunto, eis que a sua autora, Dolores Piteira, conclui dizendo: "o futuro não é risonho... vai ser lento e penoso para os habitantes do planeta e suas actividades sócio-económicas". Mais prático o almanaque adverte aos agricultores de que ,"(...) pelo menos em algumas culturas, em determinadas regiões, se podem fazer com 15 dias de avanço, bem como as respectivas colheitas".|- P.B.
DN