Aborto: Ordem dos Médicos não muda Código Deontológico
Guerra aberta entre ministro e bastonário
Bastonário Pedro Nunes não admite imposição de Correia de Campos no Código Deontológico O bastonário dos Médicos, Pedro Nunes, acusou ontem o ministro da Saúde, Correia de Campos, de teimosia por querer impor a alteração do artigo 47.º do Código Deontológico daquela ordem profissional, onde se lê que um médico incorre numa “falha grave” ao praticar o aborto, por não estar conforme com a nova legislação resultante do referendo.
A Ordem dos Médicos (OM) recusa fazer qualquer alteração por considerar inegociável uma alteração imposta pelo Governo e diz-se disposta a recorrer aos tribunais. Face a esta recusa, o ministro afirma que irá apresentar uma queixa ao Ministério Público (MP).
No último dia do prazo dado pelo Ministério da Saúde à Ordem dos Médicos para alterar o artigo 47.º, o bastonário Pedro Nunes lançou críticas a Correia de Campos. “O Código Deontológico está permanentemente em revisão e é passível de ser alterado por consenso dos médicos, o que irá acontecer em 2008, estando prevista uma consulta à classe, mas jamais será alvo de alteração por imposição do ministro, cuja atitude é abusiva.”
O bastonário sublinhou que num Estado democrático “não é admissível que um Governo coloque em causa os direitos, liberdades e garantias de uma ordem profissional. Só num Estado ditatorial são impostas alterações”.
Sobre o parecer do conselho consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR), que refere a necessidade de alteração dos regulamentos da OM, Pedro Nunes disse que tal deve ser entendido não no sentido de alteração, mas no da não aplicabilidade. “Entendemos que a leitura correcta é que os regulamentos carecem de aplicabilidade prática face à lei do País”, e salientou que “a liberdade de os médicos estarem de acordo com a lei não é violentada pela existência do código”.
Posição contrária tem Correia de Campos: “O parecer da PGR é muito claro e estabelece que cabe ao MP instaurar uma acção administrativa especial tendente à ilegalidade de alguns artigos do Código Deontológico. Vamos participar ao MP que a Ordem dos Médicos está relutante em cumprir os dispositivos.”
GRUPO MELLO CONTRA A IVG
O presidente do Grupo Mello, que gere hospitais privados e públicos, disse esta semana que, na área da Saúde, o grupo “privilegia a vida em todos os seus aspectos”. Vasco Mello, que falava num almoço promovido pela Associação Cristã de Empresários, referiu que existe um conflito entre os valores incorporados pelo grupo e o que a lei impõe. “Face a este dilema, só nos restam duas alternativas: ou saímos do negócio da saúde ou actuamos de acordo com os nossos princípios. Na gestão dos hospitais públicos cumprimos a lei, o que muitas vezes é incompatível com o nosso imperativo ético. Procuramos assegurar a nossa diferenciação pelo apoio que damos às grávidas”, afirmou Vasco Mello.
CLÍNICOS EM GREVE NO DIA 30
Os clínicos afectos ao Sindicato Independente dos Médicos (SIM) convocaram uma greve nacional para 30 deste mês, coincidindo com a greve geral da Função Pública, segundo um comunicado ontem divulgado pela estrutura representativa dos trabalhadores. A actual política laboral, social e de saúde do Governo é, globalmente, o motivo invocado pelo SIM. A paralisação decorrerá entre as 00h00 e as 24h00 de 30 de Novembro, de acordo com o pré-aviso de greve que já foi entregue. Questionado sobre a adesão dos médicos à paralisação, o bastonário Pedro Nunes afirmou que a Ordem dos Médicos “não patrocina nem interfere nas greves dos médicos, uma decisão que compete aos organismos sindicais. À Ordem compete zelar pelo bom cumprimento da Medicina”.
APONTAMENTOS
NOVAS REGRAS
A Ordem dos Médicos aprovou recentemente o regulamento que, pela boa prática assistencial, exige que o acompanhamento de um doente anestesiado ou sedado seja feito na presença de um médico anestesista. Além disso, outro novo regulamento exige que três obstetras estejam sempre em permanência nas Urgências de uma maternidade. O bastonário Pedro Nunes negou que estes novos regulamentos sejam mais uma arma na guerra contra o ministro.
CANDIDATOS
O candidato a bastonário Miguel Leão afirmou que se estivesse à frente da Ordem teria também rejeitado alterar o Código Deontológico. O seu mandatário nacional, Manuel Sobrinho Simões, defendeu uma revisão para fazer face à evolução da sociedade, afirmando que “a eutanásia vai ser um problema muito maior” do que o aborto. O também candidato Carlos Santos diz que “o Código Deontológico tem de respeitar a legislação actual”.
CM (16-11-2007)